Saturday, November 25, 2006

Dia Sem Compras - o consumo nosso de cada dia...











o consumo nosso de cada dia...

As grandes firmas de relações públicas, de publicidade, de artes gráficas, de cinema, de televisão ... têm, antes de mais, a função de controlar os espíritos. É necessário criar "necessidades artificiais" e fazer com que as pessoas se dediquem à sua busca, cada um por si, isolados uns dos outros. Os dirigentes dessas empresas têm uma abordagem muito pragmática: "É preciso orientar as pessoas para as coisa superficiais da vida, como o consumo." É preciso criar muros artificias, aprisionar as pessoas, isolá-las umas das outras. (1)

O consumo encontra-se instituído, na sociedade moderna e ocidental em que nos inserimos, como um valor cultural, como um elemento intrínseco aos nossos estilos de vida e que nos caracteriza enquanto indivíduos. Na realidade, os princípios e práticas inerentes ao consumo, toda a sua dimensão sociológica e utilidade prática no seio do modelo ideológico neoliberal, passam ainda despercebidos à generalidade dos indivíduos e possuem uma preponderância crucial mas subliminar, profunda mas sonegada, na forma como os indivíduos se concebem (são concebidos) enquanto seres sociais.

O consumo, por definição, é uma actividade que pressupõe a satisfação - geralmente por intermédio de uma troca financeira - de um conjunto de necessidades, mais ou menos, essenciais dos indivíduos. O cerne da questão é precisamente esse: quem é que determina o que é de facto uma necessidade essencial? Sendo todo o contexto social e cultural fulcral na forma como os seus valores são absorvidos, normalmente de uma forma inconsciente e automática, pela generalidade dos indivíduos, desde logo, pode-se presumir que num contexto de acelerada globalização, em que o "American Way of Life" funciona como modelo cultural, social, económico homogenizador, também os conceitos a ele inerentes, como o do consumo, obedecem à mesma lógica de acentuada "mercantilização" da vida e das relações humanas à escala global.

Ou seja, a utilidade do consumo, numa lógica liberal, está muito longe de se esgotar nessa finalidade "básica" e até "anacrónica" de satisfação de necessidades essenciais à vida humana ou, eventualmente, nem será essa a sua finalidade mais fundamental: um dos principais propósitos do consumo será o de preencher todo o vazio social decorrente da eliminação das formas de socialização e de identidade colectiva anteriores à "revolução" neoliberal. Mais até do que preencher o vazio, a sua utilidade no seio do sociedade global é a de substituir - ele próprio - essas formas, condicionando os indivíduos no sentido de participarem socialmente de uma maneira extremamente conveniente para toda a dinâmica do sistema. Esse condicionamento só é possível através de diversos mecanismos de comunicação e condicionamento de massas de entre os quais a publicidade será o mais significativo.

Por outras palavras, tão precário e volátil que o emprego se tornou, tendo a componente produtiva das empresas sido deslocada para países designados de 3ªmundo, tendo a vida social, cultural e colectiva sido esvaziada de conteúdo por um paradigma de pensamento essencialmente economicista, nomeadamente seguindo
pressupostos de apropriação individual de bens materiais, resta ao indivíduo essa função de consumidor. O consumo enquanto princípio existencial, valor de pensamento e projecto de vida. O consumo enquanto meio e fim. Do ponto de vista económico, é um consumo ilimitado que permite manter as taxas de crescimento económico que se encontram na base de todo o sistema financeiro especulativo mundial, isto ao mesmo tempo que os recursos são cada vez mais escassos e, por muito que possa custar perceber, finitos ...

O consumo possui hoje, portanto, um significado prático e sociológico primordial em todo um contexto determinado por um liberalismo adoptado à escala mundial: muito para além da sua função "pré-histórica" de satisfação de necessidades essenciais, actualmente, as supostas necessidades dos indivíduos - necessidades desde logo, muitas delas, artificialmente criadas pelos poderosos departamentos de marketing das principais corporações – são o pretexto ideal para reproduzir a disseminar o consumo enquanto instituição teológica, dogma cultural e mecanismo prático de alienação colectiva, mas por via de um crescente processo de feroz competição e estratificação individual materialista.

O consumo surge como conduta activa e colectiva, como coacção e moral, como instituição. Compõe todo um sistema de valores, com tudo o que este termo implica enquanto função de integração do grupo e de controlo social. (2) Num contexto em que os mecanismos susceptíveis de modificar e configurar toda a conjuntura mundial se encontram, de uma forma ou de outra, apropriados por um conjunto restrito de poderosas corporações - detidas por um grupo restrito de indivíduos - e quando os mecanismos democráticos convencionais são cada vez menos representativos e cada vez mais inócuos, numa sociedade que tende para a homogeneização - através desse propósito comum a todos que é o de consumir -, um dos poucos fenómenos que parece, ainda, atribuir alguma importância ao indivíduo comum é, exactamente, o consumo. Enquanto consumidores somos teoricamente bajulados por todo o género de promoções e mimos publicitários, técnicas e tácticas de propaganda.

Aturdidos que estamos nesse "propósito colectivo" e paradoxalmente ferozmente individualizante que é o de consumir, a nossa consciência social, humana e ecológica é, sobremaneira, alienada e as próprias consequências inerentes ao consumo estão muito longe de ser percepcionadas por todos nós, elos cruciais que somos nas relações existentes entre as deploráveis condições produtivas nos sítios mais remotos do mundo (destruição de habitantes naturais, situações de exploração laboral, mecanismos económicos de neocolonialismo) e as condições de consumo, sobretudo nos países economicamente mais poderosos, dado que somos nós que adquirimos esses produtos. Mas é importante salientar que também aí, nos países ditos desenvolvidos, existam enormes disparidades sociais e o próprio consumo não decorre de forma homogénea mas sim, e cada vez mais, é ele próprio sintomático da existência de estruturas socais piramidais, com enormes disparidades entre o topo e as bases.

Enquanto as “classes” do topo consomem produtos obscenamente luxuriosos e altamente ostentatórios, as classes das “bases” não deixam de poder participar no grande festim consumista liberal, com uma cada vez mais proliferação de lojas de produtos chineses fabricados, por norma, em condições ambientais e laborais deploráveis.

As repercussões de todo o sistema e do próprio consumo ao nível cultural também não são inestimáveis. Toda a nossa paisagem cultural, as cidades, as estradas, as ruas, os meios de comunicação, estão repletas de mensagens publicitárias induzindo mais e mais consumo. Um consumo obstinado, nada ético e que prejudica muito mais a vida e os seres vivos do que é realmente útil. Consumimos mais, muito mais, por consumir do que propriamente por necessitarmos de facto de satisfazer uma qualquer necessidade real, ou pelo menos uma necessidade que nos traga mais do que uma efémera sensação de felicidade.

Na economia mundial, os ricos tornam-se cada vez mais ricos. Vinte por cento do mundo consomem 80 por centro dos recursos - são dados do Banco Mundial. (O mundo) está cada vez mais nas mãos de 300 ou 400 famílias. Três famílias americanas - entre as quais a de Bill Gates - têm o equivalente ao produto nacional bruto, de cada ano, de 48 estados africanos que representam 600 milhões de pessoas. (3)

O que só demonstra esse propósito bem claro que o consumo adquire hoje, ou seja, o consumo do cidadão comum - cada vez mais restringido em termos de escolhas, dado que cada vez menos e mais poderosas corporações controlam cada vez mais sectores da economia - é o tributo que temos de pagar a esses novos senhores feudais globais. Isto os que podem pagar esse tributo mínimo e não se vêm atirados para o lodo da segregação social.

Como se não bastasse, e só para elucidar ainda melhor acerca da natureza doentia do consum(ism)o A ONU calcula que o conjunto das necessidades básicas de alimentação, água potável, educação e cuidados médicos da população mundial poderia ser coberta com uma taxa de menos de 4% sobre a riqueza acumulada das 225 maiores fortunas. Satisfazer os requisitos básicos de água e saneamento de todo o mundo custaria apenas 13 biliões de dólares, sensivelmente, a mesma quantia que a população dos Estados Unidos e da União Europeia despende anualmente em perfume.(4)

A questão que urge colocar é como chegámos a este ponto de perversidade? Como é que chegamos a um ponto em que consideramos mais natural o nosso direito a adquirir produtos, mais ou menos, supérfluos de cosmética do que o direito de milhões de seres vivos a uma vida condigna?

Porque a preponderância do consumo apesar de bastante subliminar não é inocente, bem pelo contrário. No dia 25 de Novembro celebra-se a nível mundial o Buy Nothing Day, ou seja, "Dia sem compras", naquilo que constitui um desafio à abstinência em relação ao consumo por 24 horas, com um propósito global mais amplo que é, precisamente, o de gerar um processo de reflexão colectiva capaz de questionar os modelos de pensamento deshumanizantes e perversos associados ao consumo. Nomeadamente, reflectir sobre a forma despótica e silenciosa como ele se apoderou das nossas vidas e das relações humanas.

Portugal, país onde a proliferação de grandes centros comerciais e afins não cessa de aumentar, a fúria consumista é particularmente selvagem e alienadora, com os apelos e induções agressivas ao consumo a aumentaram ao mesmo ritmo que as condições sociais se deterioram brutalmente. Por esse motivo, e por todas as questões que lhe estão associadas que urge suscitar, o Dia Sem Compras pretende ser um ponto de partida para uma sociedade diferente.

Numa época pré-natalícia, em que o aliciamento ao consum(ism)o adquire contornos de verdadeiro fenómeno de psicose colectiva, o que se pretende é lançar bases de reflexão sobre aquilo que nós próprios somos enquanto seres sociais. Será que vamos, em letárgicas visitas aos centros comerciais, continuar a aceitar o papel de meros consumidores, e reduzir toda as nossas dimensões pessoais, sociais, humanas a uma mera escala de bens materiais que nos pretendem fazer crer ser essenciais para a nossa vida e felicidade?

Será que não podemos acreditar que uma sociedade que se designa por "de consumo", ou seja, descartável, despojada de conteúdo, desumana, se torne numa sociedade bem mais igualitária, fraterna e solidária para todos os seres?

Uma questão, entre tantas outras, a ser lançada no Dia Sem Compras.

mais informação sobre o Dia Sem Compras em:

http://www.gaia.org.pt/?q=node/797

A propósito do consumo e da globalização um livro absolutamente essencial: No Logo, de Naomi Klein, ed: Relógio de Água

(1) Chomsky, Noam. Duas horas de lucidez. Mem Martins, Editorial Inquérito.
(2) Baudrillard, J. (1996). A sociedade de consumo. Lisboa, Edições 70.
(3) Zanotteli cit. in. Marujo, A. (2003). Missionário "mais incómodo" de Itália quer igreja empenhada contra armamento, Público, nº4671 / 5 de Janeiro de 2003, pp. 21.
(4) Ramonet, I. (1998). The politics of hunger. [Em linha]. Disponível em <
http://mondediplo.com/1998/11/01leader>. [Consultado em 10/01/2003].


Thursday, November 16, 2006

For a Nuclear free world















Numa sociedade onde a apatia e resignação são muito generalizadas, quase que seria impossível deixar de me sentir muito entusiasmado com as notícias que chegam da Alemanha da mobilização de pessoas, movimentos, jovens ... contra aquele que é um dos “negócios” mais “sujos” do nosso planeta: a energia nuclear ... é inconcebível como se produzem resíduos para os quais não existe qualquer solução, que serão um legado cancerígeno para os nossos filhos durante centenas de anos ... também em portugal surgem alguns profectas tecnocratas e gananciosos a apregoar a “inevitabilidade” da opção nuclear ... opção? Que sentido de humor...

Ai quem me dera estar ao lado daqueles activistas nos “bloqueios Castor” ... e mais ainda, quem me dera que eles não fossem necessários, que pudessemos viver num mundo “limpo” do cancro nuclear ... e o que nos impede de lutar por isso? De exigir o nosso primordial direito a isso? Ou quem nos impede? São os tecnocratas? Os políticos? A polícia? Ou todos nós que ficamos sentados em casa confortavelmente no sofá em vez de nos sentarmos ao lado daquela gente linda nos bloqueios “Castor” ?

Imagens que tocam:

http://www.indymedia.org.uk/en/2006/11/355633.html


Wendland, Germany: Resisting Castor Nuclear Transport [en]

http://www.indymedia.org.uk/en/2006/11/355633.html


((i)) | 09.11.2006 23:22 | Climate Chaos | Ecology | World


From Friday 10th of November, around 20,000 German police were mobilised to guard the transportation of highly radioactive nuclear waste from France to Germany [Map] in containers called "Castor". The destination was Gorleben a village in northern Germany in a region called the Wendland. Protest actions took place throughout France and Germany, especially on Sunday along the last 50 kilometres of the route on rail, and on the early hours of Monday during the final 20 kilometres by road. For many activists this years Castor transport was a prelude to the protests against the next G8 summit in Germany in June 2007, where many groups call for blockades motivated by past experiences in the Wendland.


Monday, November 06, 2006

“Transe”











Já há bastante tempo que um filme não me tocava de forma tão “visceral” e me infundia emoções tão profundas e, de certa forma, perturbadoras. Transe, sem ser propriamente um filme documental (mesmo expondo de forma tão inexorável o drama do tráfico de “carne humana”), é um perturbante (é o mínimo que se pode dizer) testemunho de uma “tragédia” quotidiana que é a exploração da miséria de milhares, milhões até, de raparigas e mulheres neste nosso planeta... milhões de rapariguinhas (algumas delas ainda mal “despedidas” de uma fugidia infância) que, face à miséria de suas vidas, poucas mais perspectivas lhes restam do que agarrarem-se à ténue esperança de um emprego num qualquer país “rico”. E face à miséria também económica dos seus países de origem, até um país pobre, como por exemplo Portugal, consegue passar por país rico... Como nos oferece paradoxos tão interessantes a ordem neoliberal em que habitamos ...

Transe é um verdadeiro soco no estômago. Um soco no estômago que em larga medida é importante levarmos, sobretudo no sentido de despertar para um drama que tem a exacta escala de cada um dos seres humanos, sobretudo mulheres, de que os seus contornos se revestem ...

E creio que é essa sobretudo a dimensão mais essencial em “Transe”: a escala individual e pessoal dessa mesma tragédia e calamidade neo-esclavagista que uma sociedade essencialmente chauvinista e patriarcal persiste em reproduzir, alimentar, ignorar ... e dela todos nós somos cúmplices com o nosso silêncio, com a nossa indiferença, com a nossa insensibilidade para o drama que se desenrola mesmo ao nosso lado, numa das boates da nossa cidade nocturna, na rua, seja onda for... porquê?

No livro acabei por abordar a questão de uma forma algo lacónica talvez pela dimensão da questão em causa, mas acima de tudo pareceu-me relevante deixar essa reflexão ... “aquela” mulher que vemos nas ruas, nas boates, na berma da estrada, é um ser humano ... um ser humano, apesar de tudo, com a sua personalidade, identidade e sonhos, que numa grande parte dos casos será bem diferente do pesadelo da prostituição ... e uma “puta” não é somente uma “puta”, uma “puta” é uma rapariguinha, uma mulher, um ser humano ...

um parágrafo mais “dedicado” à reflexão sobre o conceito de “turismo de massas”, mas de qualquer das formas, creio que a exploração de milhares de raparigas, a prostituição, não deixa de ser uma das vertentes mais relevantes do “fenómeno” do turismo de masas ...

Estive a falar com a Joana, uma das responsáveis da agência nacional checa do programa juventude, sobre o país e particularmente Praga. Com a vulgarização dos voos “low-cost”, Praga começou a ser invadida de multidões ainda maiores de turistas, alguns dos quais somente para o fim-de-semana. A indústria do turismo de massas e outras que lhe estão inerentes: alcool, prostituição e drogas sofreu um “boom” de tal forma significativo que ocorreu uma enorme descaracterização na própria estrutura histórico-cultural da cidade, proliferando os bordeis, casas de sexo várias, lojas de bebidas alcoólicas e outras lembranças próprias de turismo de massas. O turismo, de uma oportunidade de promover a interculturalidade e aprendizagem a este nível, torna-se em algo que essencialmente torna cidades inteiras em parques de diversões para multidões de turistas. Quando era mais novo, fui várias vezes com os meus pais para o sul de Espanha e lá o turismo era bastante assim ... com um monte de “benidorms” espalhadas ao longo de toda a costa, com uma total descaracterização aos mais diversos níveis: ambiental, cultural, etnográfica. Infelizmente Portugal também não é muito diferente, basta observar no que o Algarve se tornou.

Praga é uma cidade particularmente bela, e não é propriamente agradável vê-la infestada desses turistas à procura de diversão barata, regada por litros de bebidas alcoólicas e muito sexo ... sendo as mulheres tratadas como um autêntico pedaço de carne que se paga para usar e abusar.”


in Pereira, Pedro Jorge; “Be the Change you Want to See - uma outra perspectiva do mundo através do voluntariado”, (Porto, Planeta Terra: GAIA, 2006) p.156


Transe” - (FRA/ITA/POR/RUS) 2006 126 min – Teresa Villaverde . Ana Moreira, Viktor Rakov, Robinson Stévenin

http://www.clapfilmes.pt/transe/

A história de Sónia, uma mulher de 20 e poucos anos que abandona o namorado e a família, em São Petersburgo, na Rússia, e decide partir sem olhar para trás para tentar encontrar uma vida melhor noutro país. Sónia vai conhecer a ilusão de uma vida nova e o inferno daqueles a quem a vida parece nada ter para dar. Fazendo a sua "via sacra" Europa fora, atravessando todo o continente, primeiro pela Alemanha, depois Itália, para acabar no extremo oposto, em Portugal, ela vai conhecer toda a miséria e degradação que o tráfico e a exploração dos mais fracos provoca. Um filme sobre a exploração e o tráfico de mulheres que a realizadora Teresa Villaverde ("Os Mutantes") explica a partir das palavras de Santa Teresa de Ávila: "O inferno é um cão a ladrar lá fora". "Estamos no início do século XXI e o cão ladra em toda a parte. Não nos livrámos da tortura, da escravatura, do genocídio. A personagem central deste filme vê esse inferno de frente e de muito perto. Penso que não chega a entrar, porque é preciso fazer parte do inferno para estar lá dentro. Ela não faz parte, mas não há saída. Jorge Semprún escreveu a propósito da sua experiência num campo nazi que um dos motores da sobrevivência é a curiosidade. Se não quisermos olhar, as chamas agigantam-se."

Saturday, November 04, 2006

GAIA lança A HERANÇA : Dia 4 e 10 de Novembro. O tempo de mudança é AGORA!








http://www.gaia.org.pt/


4 de Novembro

Dia Mundial contra as Alterações Climáticas

Relembramos neste dia Mundial contra as Alterações Climáticas a necessidade de preservar a herança de vida, que é este nosso planeta azul.


10 de Novembro

Dia Mundial contra a Shell


Ken Saro-Wiwa foi um escritor, poeta e produtor de televisão na Nigéria.

Quando assumiu funções de presidente do Movimento para a Sobrevivência do Povo Ogoni (MOSOP), uma das etnias que vivem no delta no rio Níger, Wiwa lutou pela defesa dos direitos dos 550 mil habitantes da região.

A HERANÇA - “O Mundo dos nossos Filhos”











A HERANÇA -

O Mundo dos nossos Filhos”

por Pedro Fontoura


http://www.gaia.org.pt/?q=node/697


A Terra é uma excepção.

Em todo o sistema solar ela é, até onde sabemos, o único planeta habitado.

Nós, humanos, somos uma entre milhões de espécies separadas que povoam um mundo que transborda de vida.

No entanto, a maior parte das espécies que existiram já não existem.

Depois de terem proliferado durante 180 milhões de anos os dinossauros foram extintos até ao último. Não ficou nenhum para contar a sua história.

Existem hoje algumas teorias, relativamente ao seu desaparecimento, que apontam como causa da sua extinção o facto destes espécimes, com um forte potencial evolutivo e uma adaptação fantástica ao seu ambiente, terem esgotado os recursos do mundo que os viu nascer... e mais tarde padecer e perecer.

Talvez o acidente crítico na história dos répteis ancestrais não tenha sido o choque de um corpo celeste com este planeta azul – o nosso templo vivo – mas sim o embater de uma espécie desmesuradamente “faminta” que não teve a “inteligência” de gerir um mundo pré-histórico que se tornou insustentável.


Os anos passaram. Já não são os dinossauros que habitam este planeta.

Existe uma nova espécie com uma fome igualmente desmesurada.

Temos em acréscimo algo a que chamamos inteligência.

Contudo, em vez de a usar-mos para sustentar as nossas necessidades de sobreviver e partilhar o conhecimento que ela nos proporciona, alimentamo-nos do sangue negro do corpo do nosso planeta que padece: o petróleo.

Movemo-nos como detentores de um reino de que não somos senhores mas apenas convidados, apresentando-nos como uma ameaça para todas as espécies existentes, e em última estância para nós próprios.



Olhando do espaço, conseguimos distinguir na Terra miríades de pontos luminosos na superfície. Uns são facilmente preceptiveis como sendo cidades. Porém, uma parte substancial são impressões digitais de crimes. Não são mais do que queimadas realizadas nas zonas florestais do planeta.

Cada ponto luminoso, das centenas que podem ser avistados diariamente, corresponde à pira funerária de milhares de árvores, em queimadas megalómanas, patrocinadas por empresas petrolíferas como a Shell.

A destruição das florestas naturais e a libertação de grandes quantidades de dióxido de carbono pelos automóveis e máquinas afins que utilizamos, têm vindo a intensificar a concentração deste gás na atmosfera.

Como consequência, temos vindo a assistir por todo o planeta ao chamado aquecimento global: um aumento da temperatura média superficial global que se têm registado nos últimos 150 anos.


Especialistas alertam num relatório encomendado pelo governo britânico (publicado na edição de 31 de Outubro de 2006 do Jornal de Notícias), que mesmo que a poluição acabasse agora, os gases com efeito de estufa continuariam a aquecer o clima durante mais de 30 anos e o nível dos mares subiria durante mais um século:

(…) O Mediterrâneo vai assistir a um aumento do stress hídrico, ondas de calor e fogos florestais. Portugal, Espanha e Itália serão os países mais afectados. O derretimento das neves alpinas e precipitações extremas podem aumentar a frequências das cheias nas principais bacias hidrográficas como as do Danúbio, Reno e Ródano. Muitos países costeiros em toda a Europa serão vulneráveis à subida do nível do mar (…)”.

Neste mesmo artigo, um especialista da cidade do Porto em alterações climáticas alerta:

(…) Estamos a mudar a composição da atmosfera, ao emitir mais gases com efeitos de estufa, especialmente dióxido de carbono. Se esta tendência continuar, e tudo indica que sim, vão ser cada vez mais prováveis ondas de calor, com valores de temperatura acima do usual. São estas alterações que explicam fenómenos de chuva como os que se passaram há dias no país (…)”.

A natureza sempre encontrou soluções para resolver estas encruzilhadas... a bem ou a mal!

A questão que se coloca é que a resolução que este problema apresenta pode resultar ou na nossa evolução enquanto seres humanos, para uma espécie cada vez mais consciente do seu potencial, não usando a inteligência como uma arma nas mãos de uma criança; ou os nossos monumentos ao consumismo e à arrogância da nossa cobiça, construídos sobre os cadáveres de outras espécies do planeta, acabarão por desabar sobre nós...

O momento é crítico, o tempo é escasso... O planeta que tudo nos deu, tudo nos pode retirar.

Nós pertencemos à Terra, e a Terra não pertence a nós.


E transcrevendo as palavras de Carl Sagan no seu livro “Biliões e Biliões”, sobre esta Terra em que vivemos:

(…) As nossas vidas futuras dependem daquilo que lhe damos, e como a trata-mos.Nós que só cá estamos há cerca de um milhão de anos fomos a primeira espécie a descobrir formas de se auto destruir.Somos raros e preciosos por estarmos vivos, por pensarmos tão bem como pensamos. Temos o privilégio de influenciarmos e talvez controlarmos o nosso futuro.É nossa obrigação lutarmos pela vida na Terra – não apenas por nós, mas também por todos aqueles, humanos e outros, que vieram antes de nós e para os quais estamos em dívida e por todos aqueles, se tivermos juízo, que virão depois. Não há causa mais urgente, nem dedicação mais adequada, do que a protecção do futuro da nossa espécie. Quase todos os nossos problemas são causados por seres humanos e podem ser resolvidos por seres humanos (…)”.

Nenhuma convenção social, nenhum sistema político, nenhuma multinacional vai impor as opções que fazemos na nossa vida.


Levanta-te cedo.

Dá uma corrida.

Toma um banho no mar.

Dá um salto ao jardim.

Passeia com as crianças.

Usa o transporte público.

Usa a bicicleta.

Não colabores com a poluição da tua cidade.

Não colabores com os atentados ambientais causados pelas petrolíferas.

Sente-te vivo.

Sente-te saudável.

Não precisas do ginásio.

Descobre o mundo maravilhoso que se esconde na tua cidade: as pessoas; a cultura; a natureza.

Se o homem anda atrás do paradigma do paraíso perdido é altura de o encontrar em si mesmo em consonância com a natureza.

Olhemos à nossa volta e veremos quanto temos perdido por não termos aberto o coração e a mente ao mundo maravilhoso que nos rodeia.