Tuesday, February 17, 2009

crise ou simplesmente mudança?

"Não pretendemos que as coisas mudem se sempre fazemos o mesmo. A crise é a melhor benção que pode ocorrer com as pessoas e países, porque a crise traz progressos. A criatividade nasce da angústia, como o dia nasce da noite escura. É na crise que nascem as invenções, os descobrimentos e as grandes estratégias.
Quem supera a crise, supera a si mesmo sem ficar "superado".
Quem atribui à crise seus fracassos e penúrias, violenta seu próprio talento e respeita mais aos problemas do que às soluções.
A verdadeira crise é a crise da incompetência.
O inconveniente das pessoas e dos países é a esperança de encontrar as saídas e soluções fáceis. Sem crise não há desafios, sem desafios, a vida é uma rotina, uma lenta agonia. Sem crise não há mérito. É na crise que se aflora o melhor de cada um.
Falar de crise é promovê-la, e calar-se sobre ela é exaltar o conformismo.
Em vez disso, trabalhemos duro. Acabemos de uma vez com a única crise ameaçadora, que é a tragédia de não querer lutar para superá-la".

Albert Einstein

Tuesday, February 03, 2009

A árvore das patacas somos nós



um excelente artigo que exprime de forma muito correcta muitos traços quase fatais e crónicos deste nosso país à beira mar plantado (e em frente ao qual continua a erguer uma pálida barreira de cimento e betão). Sem dúvida muito lúcido e de leitura fundamental ...
em relação ao Ministério de Agricultura ... creio que os agricultores tradicionais, os que amam verdadeiramente a terra, podem bem dizer ... com amigos como estes que precisa de inimigos?
é difícil encontrar um ministério tão comprometido com os lobbies transgénicos e defensor dos grandes interesses agro-industriais
ah, a formatação do artigo está um pouco estranha mas foi o melhor que se conseguiu arranjar ;O)


A árvore das patacas somos nós
Luísa Schmidt sobre o potencial Português (Expresso)

9:00 Domingo, 1 de Fev de 2009
>
> Um quilo de flor de sal de Castro Marim vale actualmente mais de 45
> dólares no mercado gourmet norte-americano. Parece surpreendente. O
> empresário que consegue esta proeza não beneficia de nenhum PIN! E,
> contudo, com um produto assim rústico e tradicional, consegue gerar um
> enorme valor - muito acima daquele que se consegue com o boçal e
> repetitivo produto igual em toda a parte.
> O caso parece extraordinário mas o mais extraordinário é que não o é.
> O país tem um enorme potencial para produtos de qualidade capazes de
> induzir desenvolvimento e riqueza, de incorporar tecnologia e de
> projectar internacionalmente as empresas que neles apostam.
> E não é só a flor de sal de Castro Marim, ou o clássico vinho do
> Porto, ou as conservas célebres e raras como as da Tricana, ou os
> azeites excelentes... Apesar dos ICEP (e API ...) todos que tem
> havido, muitos produtos há que se encontram numa espécie de limbo
> comercial: a sua excelência é reconhecida, mas não conseguiram
> aparecer fora do esconderijo onde vivem. Porquê?
> Particularmente no plano alimentar, Portugal tem recursos fantásticos
> infelizmente malbaratados por gerações sucessivas.
> Basta ver a espantosa oferta sobretudo italiana e francesa, e também
> alguma espanhola, para perceber que qualquer coisa neste país anda
> enganada.
> Há um sector então onde tudo parece ainda mais especial: o dos
> chamados produtos biológicos. Portugal tem condições óptimas para
> estes produtos - que, além de objectivamente excelentes, têm ainda uma
> condição comercial muito favorável. Em plena crise, a procura deste
> produtos não só não diminuiu, como continua a justificar a abertura de
> mais pontos de venda um pouco por todo o país.
> Para mais, segundo um relatório internacional, ao nível do mercado
> mundial continua a existir uma procura muito superior à oferta.
> Acresce que em vários países europeus, com destaque para a Itália, há
> uma aposta crescente neste tipo de consumos: desde as cantinas
> escolares e hospitalares, aos agro-turismos que são cada vez mais
> procurados.
> A agricultura biológica que se estende à pecuária e à agro-indústria,
> tem, como se sabe, inúmeras vantagens ambientais e nutricionais.
> Produz sem recurso a pesticidas químicos, usa adubos naturais, e dela
> resultam produtos muito mais saborosos e duradouros.
> E é nisto então que o país aposta em força e com coragem? Não. Uma
> velha sensibilidade bronca que gerações sucessivas de responsáveis vêm
> herdando e transmitindo desde os tempos heróicos das campanhas do
> trigo, não consegue deixar de rir com descrédito destas coisas que
> considera pueris e ilusórias, quando afinal são elas que permitem
> colher patacas de árvores.
> A agricultura industrialista gosta de produções musculadas. Contudo
> (sobretudo num país como Portugal), o negócio está cada vez mais nas
> agriculturas cuidadosas e subtis, quase artísticas. Produtora de
> excelência, a agricultura biológica beneficia o ambiente, o
> consumidor, o empresário e ainda outros sectores.
> Se, além disso, for transmitida a ideia de que a excelência destes
> produtos oferece uma experiência superlativa quando consumidos no
> local de produção, teremos ainda um movimento de cultura local e de
> turismo de excelência.
> E perante isto, que empenhos movemos nós? Prédios e apartamentos
> encavalitados com vista para o mar, para onde fazemos desaguar os
> esgotos de todas aquelas casas numa cacafonia urbanística que nos não
> distingue de todos os outros sítios!
> Recorde-se que, onde hoje se produz a preciosa flor de sal de Castro
> Marim, estava para ser construída uma mega-ETAR ao serviço das
> retretes das vastas urbanizações de Monte Gordo.
> Impõe-se uma mudança de paradigma como agora tanto se diz também. As
> produções bio que acrescem em valor à excelência natural dos produtos
> tradicionais são verdadeiramente as patacas das árvores que temos.
> E tudo isto pensando apenas no produto natural e fresco. Se lhe
> acrescentarmos a transformação (conservas, caldas, doces, fumados) e
> ligarmos tudo isto aos recursos naturais e à paisagem - imagine-se o
> potencial de riqueza que temos.
> Foi isso que o 'velho' Porter nos veio dizer há anos e, mesmo assim,
> não parámos de destruir as condições ambientais necessárias à nossa
> boa árvore das patacas.
> Os espanhóis já perceberam isto, tanto que a ministra da Agricultura
> de Espanha esteve há pouco tempo em Portugal para assinar uma Carta
> Ibérica das produções biológicas que, para eles, constituem um grande
> horizonte de esperança e investimento.
> Por cá ao facto foi dada tanta importância, que o nosso ministro da
> Agricultura, tão hábil a mobilizar os media, não se dignou
> considerá-lo notícia.
> O país não tem que se queixar da sorte e do destino. O que tem à mão é
> precioso. A riqueza em Portugal consiste antes de mais em não
> estragá-la.
> Não há zonas livres...
> Passados dois anos da publicação da portaria que permite às autarquias
> e regiões declararem-se livres de OGM, ou seja, interditarem o cultivo
> de organismos geneticamente modificados, Portugal tem apenas uma: o
> município de Lagos. A portaria está de tal modo armadilhada que torna
> quase inviável a existência destas zonas.
> Começa por exigir que haja um mínimo de 3 mil hectares de exploração
> agrícola contínua por acordo entre todos os agricultores. Depois, os
> municípios que pretendem ser livres de OGM têm de obter a aprovação da
> proposta em Assembleia Municipal por maioria de dois terços; mas basta
> que um único agricultor da zona não queira participar nesta
> classificação, para todo o processo se gorar. Há qualquer coisa de
> transgénico nesta legislação... A portaria que, em princípio, viria
> regular as zonas livres; na prática veio bloqueá-las. Era mais rápido
> dizer que são proibidas!
> Acresce que o princípio secretista em Portugal continua tão fundo que
> é impossível saber onde ficam todas as explorações de OGM. Isto apesar
> do Ministério da Agricultura estar obrigado por lei a publicar esta
> informação online e ter já dois pareceres da Comissão de Acesso aos
> Documentos Administrativos a considerar que a informação deveria ser
> imediatamente disponibilizada. Um país como o nosso, que deveria
> apostar em nichos de produção de excelência, tem muito pouco interesse
> em apoiar os 'interesses' da indústria das plantas geneticamente
> modificadas.
> Cimento ou alimento?
> Com uma dependência alimentar externa cada vez maior - por exemplo,
> mais de 85% dos cereais e leguminosas que consumimos são importados -
> a nossa Reserva Agrícola Nacional (RAN) deveria ser escrupulosamente
> acautelada, quanto mais não seja por uma questão de segurança
> estratégica.
> Os nossos solos classificados como 'muito férteis' já correspondem
> apenas a 4,5% da superfície cultivável e somos o país da UE com maior
> percentagem de solos férteis impermeabilizados por construções de
> vária ordem. Apesar disto, o processo continua justamente sobre os
> nossos solos de melhor qualidade: as grandes plataformas logísticas,
> desde a de Castanheira de Pêra à da Trofa - estão a ser construídas
> nos tais 4,5% de solos muito férteis. Tal como a futura cidade
> aeroportuária também se projecta para cima de uma das melhores zonas
> hortícolas do país.
> Esta fúria de destruição das reservas agrícolas tornou-se tão
> insistente e regular que o próprio Ministério da Agricultura criou a
> dada altura um gabinete de... "Desanexação da RAN"! É bizarro ver um
> Ministério da Agricultura tão zelosamente anti-agrícola...
> Ministério anti-agricultura
> O sentido antiagrícola do Ministério da Agricultura não se fica pelos
> solos... As importantes medidas agro-ambientais que a UE promove e
> generosamente nos financia, têm sido manhosamente desincentivadas e
> até impedidas pelo próprio Ministério da Agricultura que as gere e
> deveria promover. Também aqui era mais rápido dizer que são proibidas.
> O pacote de medidas agro-ambientais, que é da maior importância para a
> excelência das produções e das suas respectivas condições naturais,
> tem vindo a ser drasticamente mutilado e asfixiado. Por exemplo, em
> Planos Zonais como o de Castro Verde, o prémio médio por hectare
> passou de cerca de 80 euros, em 1997, para metade no início dos anos
> 2000 e agora para um quarto. Além deste claro desincentivo que deixa
> de compensar o agricultor, o dispositivo regulamentar e burocrático
> para aceder às medidas, chega a ser grotesco de tão complicado e até
> impossível de satisfazer para um agricultor médio que não possa
> contratar uma empresa.
> Acresce que as medidas acabam por beneficiar sobretudo os
> proprietários com maior capacidade de investimento, dado que os apoios
> são apenas pagos no ano seguinte. Tudo isto será incompetência
> ministerial? Não. Parece má fé. É que os fundos europeus destinados às
> agro-ambientais, se não forem gastos, podem ser aplicados a outros
> fins e o Ministério da Agricultura encontrou neles uma espécie de
> expediente de caixa. Quanto mais não seja por uma questão de
> dignidade, neste ano de eleições europeias, o fenómeno deveria ser
> fiscalizado.
> Podemos dizer que a UE está a ser burlada nas suas intenções por uma
> conduta matreira do Ministério da Agricultura. Para não falar nos
> danos que esta 'despolítica' está a trazer a um país onde as
> agro-ambientais deveriam ser agarradas com as duas mãos.